11 2339-9601 | Rua Francisco Leitão, 653 cj 22 - Pinheiros - São Paulo / SP

Blog

O ganso sobrevivente

Cristina Rappa

Há cerca de dois anos meu irmão e minha cunhada ganharam seis gansos abençoados do convento das Carmelitas em Jundiaí (SP). Logo ganharam um destino que parecia, anos nossos olhos e das freiras, paradisíaco: o açude da fazenda, no sul de Minas, onde viveriam livres, com espaço, recebendo milho e ainda comendo frutinhas, como jabuticabas e acerolas.

Porém, a natureza tem suas regras e caprichos, e nem a benção das freiras livrou cinco das seis aves da morte misteriosa. Inicialmente as fêmeas, vulneráveis por estarem chocando os ovos, depois dois dos machos simplesmente desapareceram sem deixar vestígios, certamente comidos por algum animal silvestre faminto.

O pobre ganso sobrevivente, ciente do perigo, nos segue aflito, como a pedir socorro.  Acaba de ganhar dois companheiros – um marreco e uma pata – comprado por um amigo ao vê-los trancados em uma gaiola em uma loja. Nadam felizes, desfrutando da recente liberdade, e despreocupados. Nada melhor do que a liberdade, não?

Em uma tentativa de protegê-los, estamos providenciando uma espécie de “galinheiro”, onde eles se abrigariam à noite.

Fiquei muito triste com a situação das aves, mas me conforta imaginar que devem ter alimentado alguma família faminta de uma espécie silvestre (uma jaguatirica ou cachorro do mato, talvez?). Afinal, seriam esses predadores piores do que os políticos corruptos que nos escandalizam com seus golpes, os funcionários que desviam remédios de postos de saúde ou que atendem mal a população carente, os assassinos ao volante nas nossas estradas e cidades? Duvido muito.

De estimação e guarda

Os gansos são aves famosas por proteger a propriedade contra invasores. Apenas os nossos pobres amigos não conseguiram se proteger. Mas sempre deram sinal na chegada de alguém de fora.

Em função de sua valentia e braveza, já tem gente que os emprega como substitutos dos cães de guarda.

Mas, embora bravos, podem se tornar bons animais de estimação. Como um cão de guarda. Em meados deste mês de outubro, vejo a triste notícia do atropelamento do ganso Vem-Vem, que, há oito anos em uma casa em uma cidadezinha no interior do Rio Grande do Sul, acostumava acompanhar o dono por onde ele andava. Em uma dessas voltas, foi atropelado e não resistiu e agora o seu dono diz que pretende adotar seus filhotes.

Cristina Rappa é jornalista, profissional de Comunicação Corporativa e, de uns tempos para cá, tem se dedicado a escrever livros infantojuvenis e crônicas sobre animais e outros seres vivos.

 

O mistério do sumiço dos macaquinhos no inverno

Curioso, o macaquinho me espia antes de ir à caça das mangas

Acho uma delícia ficar observando os fenônemos da natureza e constatar o quanto ela é dinâmica. Quem acha que a vida no campo é monótona não a conhece ou a olha com olhos equivocados, com parâmetros de cidade grande, procurando outro tipo de agito.

Na natureza, ao contrário da cidade, em que todo dia tem sempre oferta das mesmas coisas (já viu faltar laranja ou abacaxi no supermercado? Mesmo que meio azedas ou sem-graça, essas frutas estão sempre lá), a dinâmica é outra e segue a lógica das estações do ano, o que faz com que o cenário e os personagens mudem totalmente conforme a época.

Hoje, por exemplo, fui surpreendida, em uma caminhada de final de tarde em horário de verão, por um bando de macaquinhos que tentava chamar a minha atenção no bambuzal, pulando de lá para cá, fazendo poses e chacoalhando os bambus, que gemiam. Antes de partir para o ataque. Das mangas, sua sobremesa parece que preferida, depois de desgustar os brotos de bambu.

Aí me dei conta de que fazia meses, muitos meses que não os via. E que eles apareciam em bando, como costumam viver, sempre nesta época, atraídos pelas mangas que começavam a aparecer no final da primavera, e, mais adiante, pelo milho verde, outra iguaria de sua preferência.

Fiz um esforço para me lembrar se alguma vez tinha avistado macacos no inverno na fazenda, quando o pomar é predominantemente cítrico. Pelo visto, não gostam muito de laranjas, limões e mixiricas. Já são mais chegados nas jabuticabas, muito abundantes neste outubro, por sinal.

E reaparecem mesmo junto com o verde que veio para ficar um bom tempo, depois de várias chuvas da primavera. Não daquelas primeiras, hesitantes. Mas as chuvas que vêm com gosto e trazem a exuberância e o perfume das mangas, dos abacates e dos mamões.

Aí surge a dúvida: para onde eles vão e o que fazem no outono e no inverno? Seriam animais de hibernação? Como os jabotis, que passam meses fechados em seus cascos?

Nunca imaginei isso deles. Devem ir procurar alimento diferente em outras paragens nessa estação.

Mas, enquanto pensava nisso, de repente acordo com uma manga voadora que por pouco não atinge a minha cabeça. Atirada por um macaquinho que, depois, malandro e divertido, foge em disparada de volta para o bambuzal, sua escala antes de entrar na mata.

Se você não se diverte ao deixar a cidade grande e vir para o campo, eles, seres do mato, bem que se divertem com você. E, cuidado, que lá vem mais manga! Ainda bem que eles ainda não descobriram a jaqueira.

 

Cristina Rappa é jornalista, profissional de Comunicação Corporativa e, de uns tempos para cá, tem se dedicado a escrever livros infantojuvenis e crônicas sobre animais e outros seres vivos.